Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

26 junho, 2011

É muito bela esta mulher desconhecida que me olha longamente

Uma mulher desconhecida olha longamente as palavras que alguém desconhecido escreve no vento.

Uma mulher desconhecida, sem nome, nos curtos espaços da manhã, nas distantes e quentes noites, pergunta-se tantas vezes quem é aquele outro que percorre florestas, longas estações, sem conseguir esquecer feridas irreparáveis de um doce amor.

Há dois dias, ao entardecer, junto ao Farol de Cacilhas, o Tejo em fundo.

É muito bela esta mulher desconhecida
que me olha longamente
e repetidas vezes se interessa
pelo meu nome

eu não sei
mas nos curtos instantes de uma manhã
ela percorreu ásperas florestas
estações mais longas que as nossas
a imposição temível do que
desaparece

e se pergunta tantas vezes o meu nome
é porque no corpo que pensa
aquela luta arcaica, desmedida se cravou:
um esquecimento magnífico
repara a ferida irreparável
do doce amor


('A mulher desconhecida' de José Tolentino de Mendonça in "A noite abre meus olhos", poesia reunida, Assírio & Alvim)

Sem comentários:

Enviar um comentário