Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

23 fevereiro, 2011

As mulheres pensam como uma impensada roseira que pensa rosas

Ninguém mais fala das mulheres com esta devoção. Herberto Helder, como se bordasse a linha fina, tece um retrato fascinado sobre a Mulher.

E eu, que gosto de ser mulher, gosto de ler estas palavras.

Somos mesmo assim: contraditórias, doces mas capazes de palavras tenebrosas, fechadas e enigmáticas umas vezes, expansivas e alegres outras, cheias de graça, anunciando felicidade ou causando lágrimas, carne e sangue ou apenas encantamento.

Duas mulheres passeiam junto ao Tejo, no passeio do Ginjal

As mulheres pensam como uma impensada roseira
que pensa rosas.
Pensam de espinho em espinho,
param de nó em nó.
As mulheres dão folhas, recebem
um orvalho inocente.
Depois sua boca abre-se.
Verão, outono, a onda dolorosa e ardente
das semanas,
passam por cima. As mulheres cantam
na sua alegria terrena.

Que coisa verdadeira cantam?
Elas cantam.
São fechadas e doces, mudam
de cor, anunciam a felicidade no meio da noite,
os dias rutilantes, a graça.

Elas cantam a eternidade.
Cantam o sangue de uma terra exaltada.


(Excertos do extraordinário 'Ou o poema contínuo' de Herberto Helder)

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