São instantes mas eu queria que fossem horas. E se são horas eu queria que fossem dias. E os dias somam-se aos dias e já são meses. E em cada instante desenhamos confidências, segredos inocentes, uma verdade tão nossa que parece ter nascido connosco, um pecado original que transportávamos sem o saber. Mas não é pecado, não, parece uma bênção, uma magia.
Afasto-me por vezes, quero ver as palavras de longe, quero ver se brilham como brilham quando em silêncio nos enunciamos secretas descobertas, memórias partilhadas, um registo de uma comunhão que parece imaginada.
E eu quero fechar a minha mão na tua para que feches nelas o nosso segredo, para que as palavras não voem, para que não fiquemos desamparados, sem as nossas asas que são comuns, sem os nossos sonhos que são os mesmos.
Fecha as tuas mãos nas minhas, envolve-me com um abraço, não deixes que os instantes se vão, prende as tuas palavras às minhas, e deixa-te ficar, sereno e alegre, olhando os meus olhos ou os meus sonhos. Guarda bem os nossos segredos. Nas nossas mãos. Meu querido.
Talvez seja apenas uma confidência. Sabemos
que cada vez mais é de nós que essas palavras
se afastam e assim se compreende melhor o sentido
que têm. Depois havemos de esquecê-las, para que se tornem
iguais a um segredo e se possa finalmente dizer
como tudo já cabe noutras mãos tranquilas e abertas.
[de Fernando Guimarães in Os caminhos habitados]
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As fotografias foram feitas no Ginjal
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