Não sei dizer palavras que te dispam, amor, como em tempos as minhas mãos, sôfregas, te despiam. Nem tu, amor, as sabias dizer quando, inocente, te despias mostrando o teu corpo de jovem mulher. Nunca fomos de palavras. Olhava-te, então, com olhos líquidos de desejo, um soluço percorrendo o meu corpo impaciente, e tu, improvisando gestos que julgavas só teus, oferecias o teu corpo mudo, ardente.
Dias e dias foram passando e nós sempre unidos, os gestos que nunca se esqueceram, o amor que se foi adoçando, o desejo que se foi alongando, e as palavras que nunca aprenderam a traduzir o que sentíamos.
A vida trouxe-nos até aqui, a este mar largo que contemplamos em silêncio. O tempo corre com vagar, azul, umas vezes macio, outras com aspereza. Assim é o tempo, assim é a vida. Enquanto nos tivermos um ao outro a vida será boa e o tempo amigo.
Quando chegarmos a casa, despir-te-ás para mim, com vagar e compreensão, por vezes com um resto de malícia, por vezes ainda com um resto de inocência, e eu olharei o teu corpo enrugado e flácido e não sentirei a sofreguidão de então mas sentirei uma ternura imensa, amor, porque na tua pele estão muitos gestos meus de carinho e desejo, gestos que jamais voarão do teu corpo pois há muito aprisionaste o meu amor. Na tua pele já eu habito há muito tempo. Não sei dizer-te isto em palavras mas o nosso silêncio guarda mil beijos, mil afagos, mil poemas, mil palavras de um imenso amor.
No pequeno jardim do Ginjal, olhando o Tejo que corre para o oceano, de frente para uma Lisboa bela e silenciosa |
O tempo permanece
Apanhado entre os livros.
Por este prodígio de apreensão,
Heraclito continua a banhar-se
No mesmo rio,
Na mesma página.
Tu continuarás para sempre
Nua no meu poema.
['Arte do Tempo' de Juan Manuel Roca in 'Os cinco enterros de Pessoa', selecção e prólogo de Lauren Mendinueta e numa tradução de Nuno Júdice]
Bill Evans - My Foolish Heart
Vives como escreves
escreves como vives
com a sensibilidade
profunda
de um poeta
com a escrita solta
atenta
de um prosador
vives
onde a vida se liberta
com o olhar deslumbrado de uma criança
vida adulta a tua
pousada
vivida
por todo o lado.
Joaquim Castilho
escreves como vives
com a sensibilidade
profunda
de um poeta
com a escrita solta
atenta
de um prosador
vives
onde a vida se liberta
com o olhar deslumbrado de uma criança
vida adulta a tua
pousada
vivida
por todo o lado.
Joaquim Castilho
Pensava,que só prós lados do DOURO,haveria ginjas das boas ! Aqui são boas belas e ternurentas! Belo ginjal...Afinal,não é preciso ir tão longe!!!
ResponderEliminarOlá Firme,
EliminarQue palavras também tão boas como ginjas. Muito obrigada.
Olá UJM!
ResponderEliminarVives como escreves
escreves como vives
com a sensibilidade
profunda
de um poeta
com a escrita solta
atenta
de um prosador
vives
onde a vida se liberta
com o olhar deslumbrado de uma criança
vida adulta a tua
pousada
vivida
por todo o lado.
um abraço
Ah Joaquim,
EliminarQue bom, um poema seu de novo aqui no Ginjal. Vai já lá para cima. Tão bonito. Muito obrigada.
Um abraço.
"Sempre amei por palavras muito mais
ResponderEliminardo que devia
são um perigo
as palavras
quando as soltamos já não há
regresso possível
ninguém pode não dizer o que já disse
apenas esquecer e o esquecimento acredita
é a mais lenta das feridas mortais
espalha-se insidiosamente pelo nosso corpo
e vai cortando a pele como se um barco
nos atravessasse de madrugada
e de repente acordamos um dia
desprevenidos e completamente
indefesos
um perigo
as palavras
mesmo agora
aparentemente tão tranquilas
neste claro momento em que as deixo em desalinho
sacudindo o pó dos velhos dias
sobre a cama em que te espero"
Alice Vieira