Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

23 março, 2013

Uma avó e uma mãe foram-me entretanto devolvidas mas não eram bem as minhas



Namorei um gato. Um não, dois. Dois não, três. E mais uns quantos de que é melhor não falar.


Gato no Ginjal


Um tinha olhos azuis, outro castanhos, outro cor de mel e dos outros é melhor nem falar. Do que mais gostei foi do que tinha olhos cor de mel. Sempre gostei de mel. Lambo-me toda. 

E gostava de ver as borboletas mas um dia duas borboletas brancas andaram atrás de mim como dois gatos, só que voavam. E um dos gatos disse, és tu com duas mariposas blancas voando, mariposas como palomas. E eu gostei que ele tivesse dito isso. Desde esse dia mais nenhuma borboleta teve grande graça.

E um dos gatos um dia disse que do que mais gostava era das minhas pernas, de subir por elas acima. Um gato safado. Outro disse que gostava do meu pescoço e beijava-me a nuca e arrepiava-me mas não se ficava por ali e punha-se a descer por mim abaixo. Outro safado. E outro... é melhor nem dizer. Só gatos safados, é o que é. 

Uma vez estava eu a passear com um dos gatos numa das ruas da grande cidade, uma rua que subia, passou por nós um carro com um grande barco atrelado. O barco desatrelou-se e foi, desgovernado, para cima do meu gato. Por pouco não se ficava ali, atropelado por um barco numa rua da cidade. 

A minha mãe não gostava muito de um dos gatos, dizia só gostas de malucos. A minha avó nunca conheceu esse. Do outro gato, a minha mãe não era grande entusiasta mas a minha avó gostava muito dele, é bonito, tem uns olhos... e uma voz... e é tão simpático... Do outro, a minha mãe gostou logo mas disse, a tua avó é que vai ter pena, gostava muito dele; mas a minha avó, quando conheceu o gato novo disse ainda é mais bonito que o outro

Dos outros não posso falar. 



[Abaixo encontrarão um divertido poema de alguém que aqui vem pela primeira vez, a única Adília Lopes. Abaixo, poderemos ouvi-la lendo poemas seus. A seguir, Nelson Freire despede-se com mais uma grande interpretação, desta vez tocando Granados.]


No Cais de Embarque de Cacilhas, mesmo sobre o Tejo, de frente para Lisboa




                                                             Minha avó e minha mãe
                                                             perdi-as de vista num grande armazém
                                                             a fazer compras de Natal
                                                             hoje trabalho eu mesma para o armazém
                                                             que por sua vez tem tomado conta de mim
                                                             uma avó e uma mãe foram-me
                                                             entretanto devolvidas
                                                             mas não eram bem as minhas
                                                             ficámos porém umas com as outras
                                                             para não arranjar complicações



['Minha avó e minha mãe' de Adília Lopes in 'A Pão e Água de Colónia']

*




O cheiro de Deus - Recital de poesia de Adília Lopes


3 comentários:

  1. Que gataria. :)As avós têm sempre razão. :)

    Bom domingo.

    Um abraço.

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  2. Só de noite é que todos os gatos são pardos (se a luz estiver apagada...)

    :)

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  3. Pôr do Sol24 março, 2013

    Os seus gatos são tão lindos e tão expressivos que essa cumplicidade deve ter um gostoso segredo.

    Bons momentos felinos.


    Boa semana

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