Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

06 janeiro, 2013

E nunca saberei se um dia a encontrei, se agora a encontro


Dizes que não sei a importância que tenho para ti e ouço-o como um lamento. Contas-me que me comparas com outras mulheres.

Procuras-me, pois, noutras mulheres. 

Quem te veja dirá, contudo, que olhas para todas as mulheres. Vêem-se absorto, talvez até com um sorriso, e pensarão que queres seduzi-las, conquistador, caçador de mulheres. Mas não. Tu dizes-me que não e eu sei que não. Procuras nas outras aquela que um dia tiveste para ti.

Dizes que dissecas com cuidada precisão o cabelo, os olhos, a boca, a expressão, o sorriso, a cor, a luz - as mulheres que vês na televisão, nos cartazes na rua, nas que se sentam à tua frente. Em todas tentas descobrir um pouco de mim, dizes. E eu acredito porque sei que comigo falas sempre verdade. 

Lembrar-te-ás, talvez, do sorriso que sorrias para mim e que eu retribuía com outro sorriso, lembrar-te-ás da aura que o sol - que entrava pela janela quase fechada - deixava em nós, lembrar-te-ás, talvez, do afecto desmedido, exultante, sequioso, do desejo que nunca mais experimentaste, do amor que, imprevistamente, encontraste.

Dizes que os teus ímpetos se extinguiram, que não mais voltaste a sentir o esplendor que, nesses tempos, dourava os teus dias.

Mas isso foi num outrora incerto e distante. Agora eu estou longe, sou apenas uma recordação, sou uma luz que se apagou e que existe apenas no sangue que escorre do teu coração. 

Ou sou talvez apenas um sonho que um dia tiveste, apenas isso. Talvez.



[Abaixo da mulher que olha com coquetterie quem passa, um poema de José Bento, poeta de quem muito gosto. Logo a seguir mais um momento feliz. Mozart une, no piano, Filipe Melo e Luiza Dedisin]



Em Cacilhas



                                   Já vi esta cabeça, esqueci onde e quando:
                                   foi num outrora incerto, mas ainda cálido, frementes;
                                   depois era uma outra, e a mesma sempre
                                   no seu perene esplendor e poderio
                                   a chamar-me com sua aura, a arrastar-me consigo,
                                   exultante e sequioso, áspero e rendido,
                                   a ser desmedida e canto e suplicante cifra
                                   do que desejo mais e nunca saberei
                                   se um dia a encontrei, se agora a encontro:
                                   lodoso manancial de ímpeto e sangue, luz total.


                                   ['Cabeça' de José Bento in Sítios]


&



Regressas
sem nunca ter chegado,
sem nunca teres partido,
sonhando sempre 
novas distâncias.
Fui eu, eu só,
que desenhei
em mim,
todos os teus caminhos!


['Ou talvez , quem sabe...' poema da autoria de Joaquim Castilho em comentário abaixo]



4 comentários:

  1. Ou talvez , quem sabe...

    Regressas
    sem nunca ter chegado,
    sem nunca teres partido,
    sonhando sempre
    novas distâncias.
    Fui eu, eu só,
    que desenhei
    em mim,
    todos os teus caminhos!


    Um abraço

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    1. Olá!

      Fantástico! Apetecia-me bater palmas e que pudesse ouvir o meu aplauso.

      Já lá coloquei o seu poema.

      Muito obrigada.

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  2. O amor, os sonhos e a paixão que põe em tudo o que escreve!!
    Lindo texto...cada um dar-lhe-à a interpretação que quizer...
    Por tudo isso merece um grande, um enorme...
    Obrigada.
    MCP

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    1. Olá MCP,

      São palavras que me aparecem depois de ler os poemas, recordações minhas e alheias, histórias inventadas e reais. Nem eu sei bem.

      Obrigada eu.

      um beijinho.

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