Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

23 dezembro, 2012

Não digo do Natal - digo da nata do tempo que se coalha com o frio


O domingo está a começar e eu hesito em desejar-vos já um bom Natal. É dia 23 de Dezembro, ainda faltam dois dias. E, depois, para mim, Natal é a tradição do dia em família, da troca de presentes, é a alegria e a surpresa das crianças, é a ternura dos olhares e dos sorrisos. Não há religiosidades que nos façam ter outras interpretações para este dia.

Recordo vagamente o nascimento de uma figura corajosa da história de todos os tempos e lembro que os heróis são assim, defendem os seus com a força interior que lhes permite vencer medos, dores, abandonos.

Mas, porque sei que, para a maioria das pessoas, o dia é um dia com uma importância muito especial, sinto-me no dever de desejar uns dias muito felizes, vividos com muito sentimento e alegria.

No entanto, as minhas palavras vão em especial para as pessoas para quem o Natal é um dia como todos os dias, ou um Natal vivido em solidão, ou um dia em que sentem, como um peso terrível, a ausência de sonhos e de sorrisos.

Para vocês, queridos Leitores, que não têm crianças e alegrias por perto, que gostariam de receber abraços calorosos, presentes festivos, e que, pelo contrário, têm lugares vazios à mesa, sombras, ausências, saudades, ou para os que estão doentes, para os que não encontram felicidade num dia assim, vão as minhas palavras.

Recebam, da minha parte, um abraço feito de palavras, recebam o meu carinho e a minha companhia, recebam as minhas imagens de gaivotas rodeando o rio e os homens, recebam os cânticos de crianças (abaixo) que encontrei para vos acompanhar. Entendam, por favor, estas minhas palavras como uma visita, como um abraço caloroso. Estou aqui, deste lado, pensando em vós, agradecendo a vossa companhia, tentando que as minhas palavras cheguem até vós. 

E, apesar de tudo, desejo-vos também um bom Natal.



Este sábado de manhã no Tejo, com o Terreiro do Paço do outro lado e eu no Ginjal



                                        Não digo do Natal – digo da nata
                                        do tempo que se coalha com o frio
                                        e nos fica branquíssima e exacta
                                        nas mãos que não sabem de que cio

                                        nasceu esta semente; mas que invade
                                        esses tempos relíquidos e pardos
                                        e faz assim que o coração se agrade
                                        de terrenos de pedras e de cardos

                                         por dezembros cobertos. Só então
                                         é que descobre dias de brancura
                                         esta nova pupila, outra visão,

                                         e as cores da terra são feroz loucura
                                         moídas numa só, e feitas pão
                                         com que a vida resiste, e anda, e dura.


                                        [Soneto de Pedro Tamen in Memória Indescritível]

8 comentários:

  1. lindissimo poema de natal, um soneto como só um grande artifice da poesia pode fazer, aproveitemos pois estes dias sem pensar nos outros. e boas festas.

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    1. Olá Patrício Branco,

      Tem razão. A poesia nasce de quem tem que nascer e de quem sabe tratar as palavras com labor e carinho.

      Obrigada pelas suas palavras e pela sua presença.

      Um feliz 2013 para si e para todos os que lhe são mais queridos!

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  2. E que belo abraço, feito de palavras, se recebe ao ler o que escreve!!!
    São palavras que enchem e reconfortam os nossos corações.
    Obrigada por isso.
    Aqui neste seu cantinho, lhe desejo Festas Felizes.
    Aquele Abraço!!!
    MCP

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    1. Olá MCP,

      Tardiamente aqui estou para agradecer as suas palavras amorosas. Muito obrigada pela sua companhia tão amiga.

      Feliz 2013 para a família actual e para os elementos que estão para chegar!

      Um beijinho!

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  3. Querida UJM

    É por estas e por outras...palavras que me não canso de aqui vir, e gostaria de o poder fazer mais vezes, por tudo o que daqui levo.

    Mais uma conjugação perfeita entre estes três elementos, o poema, a imagem, o seu texto. Ainda há dias ouvi a leitura deste mesmo soneto de Pedro Tamen, algures, e lembro-me de como o achei tão peculiar na sua menção aos 'tempos relíquidos e pardos'.

    Penso que a sua mensagem será um bálsamo para todas as almas solitárias que em datas como esta sentem com maior rigor o peso da solidão.

    Mais uma vez os meus votos de um FELIZ NATAL.

    Beijos

    Olinda

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    1. Olinda,

      As minhas desculpas pela resposta tardia. Tenho tido uns dias atarefadíssimos, sem tempo livre e estou muito cansada. Mas, embora tarde e más horas, estou agora aqui para lhe agradecer as suas palavras sempre tão queridas, tão amigas.

      E quero também desejar-lhe um feliz 2013: saúde, sorte, tudo de bom para si, para a sua filha, para toda a sua família.

      Um beijinho e feliz 2013!

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  4. No Natal costumo lembrar-me deste poema do Eugénio:

    ÚLTIMO POEMA

    É Natal, nunca estive tão só.
    Nem sequer neva como nos versos
    do Pessoa ou nos bosques
    da Nova Inglaterra.
    Deixo os olhos correr
    entre o fulgor dos cravos
    e os dióspiros ardendo na sombra.
    Quem assim tem o verão
    dentro de casa
    não devia queixar-se de estar só,
    não devia.

    Eugénio de Andrade, in Rente ao Dizer.

    Para quem não tem uma família grande nem a alegria das crianças, é muito bom receber as palavras de conforto e solidariedade da nossa querida Jeitinho.
    God bless you!

    Um beijinho meu, outro da minha mãe.

    Antonieta

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    1. Olá Antonieta,

      É quase imperdoável que só agora esteja a responder.

      Mas estes dias aqui em casa têm sido uma coisa indescritível. Ainda há pouco acabámos de pregar os últimos quadros que mudaram de sítio. Entre obras, rearrumação de livros e idas a casa de familiares, ando sem um minuto livre. Agora estou aqui num contra-relógio para ver se consigo formular uns votos de bom ano que se vejam mas já estou atrasada.

      O que quero dizer-lhe é que, mesmo quando não tenho tempo para responder, leio sempre e que gostei muito deste poema mas que achei tão triste.

      Espero que o ano novo lhe traga alegrias, muitas alegrias, inesperadas alegrias.

      Diga, por favor, à sua mãe maravilhosa (e com um cabelo invejável) que lhe desejo muita saúde e muitas felicidades também para ela.

      Um beijinho para as duas e feliz 2013!

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