Poderíamos voar, um na direcção do outro, se tivéssemos asas. Mas não temos.
Poderíamos falar um com o outro. Mas não falamos para ninguém nos ouvir.
Poderíamos encontrar-nos um com o outro, mas não o fazemos porque nos podem ver.
Poderíamos, poderíamos, mas nada fazemos porque pomos a opinião dos outros acima da nossa própria opinião.
Pomos...? Eu não, eu não sou assim.
E tenho sempre presente que a vida é breve. Por isso, não perco tempo à espera do último verso.
Hoje, jardim do Ginjal e Tejo, vistoas a partir da Csa da Cerca |
Firmamos os pés na terra que é
como quem diz no
assoalho que é como quem diz na
terra
Aguardamos: asas que ninguém
nos vem fixar aos pés aos sovacos
às orelhas. Aguardamos
asas
Preenchemos o tempo gritando
por socorro ou fazendo amor sem ruído
de preferência debaixo da
cama
Não vá acontecer - tu já sabes
como as pessoas são - vir
alguém só para dar o
flagra.
('Nós', poema de Rui Caeiro in 'O quarto azul e outros poemas')
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