Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

06 julho, 2011

A própria luz não ajudava: não era barco de manhã nem brisa ao fim da tarde

Ao fim do dia, veleiro no Tejo


Estou aqui a apanhar os últimos raios deste sol quente de verão, junto ao rio.

Um veleiro passa, vindo dos lados do oceano. É quase transparente, não sei se não saíu da minha imaginação.

Dele sai um pássaro que voa na minha direcção.
Pousa no chão perto de mim, ao sol, aquece-se e, devagar, vem na minha direcção. E eu ando na direcção dele. Não voa, olha-me e deixa-se ficar, eu ando e ele junto a mim. Não me estranha, tal como eu não o estranho.

Depois de sobrevoar o Tejo, pousa ao sol, e vem na minha direcção, sem me estranhar

Depois, quando me vou embora, ele levanta voo, confortado pelo sol, atravessa o rio, penso que se junta ao veleiro transparente, irá talvez para os mares do sul.

Mas tomara que volte amanhã.

Há pouco no Ginjal, Lisboa dourada do outro lado, pássaro levanta voo e sobrevoa o Tejo

Talvez nem seja um tordo. Um pásaro
cantava. Seria o último
desse verão. A própria luz

não ajudava: não era barco
de manhã nem brisa ao fim da tarde.
Talvez o anjo do poema

pudesse em seu lugar subir aos ramos
e cantar. Mas os anjos
são tão distraídos! Deles não há

nada a esperar, a não ser o fogo
de palha. Talvez nem seja um tordo.
O seu canto, só vibração no ar.
('Fim de verão' de Eugénio de Andrade in Os lugares do lume)

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