| Ao fim do dia, veleiro no Tejo |
Estou aqui a apanhar os últimos raios deste sol quente de verão, junto ao rio.
Um veleiro passa, vindo dos lados do oceano. É quase transparente, não sei se não saíu da minha imaginação.
Dele sai um pássaro que voa na minha direcção.
Pousa no chão perto de mim, ao sol, aquece-se e, devagar, vem na minha direcção. E eu ando na direcção dele. Não voa, olha-me e deixa-se ficar, eu ando e ele junto a mim. Não me estranha, tal como eu não o estranho.
| Depois de sobrevoar o Tejo, pousa ao sol, e vem na minha direcção, sem me estranhar |
Depois, quando me vou embora, ele levanta voo, confortado pelo sol, atravessa o rio, penso que se junta ao veleiro transparente, irá talvez para os mares do sul.
Mas tomara que volte amanhã.
| Há pouco no Ginjal, Lisboa dourada do outro lado, pássaro levanta voo e sobrevoa o Tejo |
Talvez nem seja um tordo. Um pásaro
cantava. Seria o último
desse verão. A própria luz
não ajudava: não era barco
de manhã nem brisa ao fim da tarde.
Talvez o anjo do poema
pudesse em seu lugar subir aos ramos
e cantar. Mas os anjos
são tão distraídos! Deles não há
nada a esperar, a não ser o fogo
de palha. Talvez nem seja um tordo.
O seu canto, só vibração no ar.
('Fim de verão' de Eugénio de Andrade in Os lugares do lume)
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