Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

17 fevereiro, 2014

E estou tão leve porque não tenho nenhum segredo e tão oculto porque daqui a nada já posso dizer tudo. [Herberto Helder na voz de Fernando Alves pela mão do Cine Povero - uma maravilha]


Veleiro no Tejo, a ponte Vasco da Gama ao fundo
Avistado a partir do Ginjal


Levanto à vista
o que foi a terra magnífica
e as estações mais bêbedas
E estou tão leve
porque não tenho nenhum segredo
e tão oculto
porque daqui a nada
já posso dizer tudo.
Daqui a uma pouca ciência
saberei pensar que daqui a um pouco depois
estarei morto
e só de pensar
já nem respiro
já quase
em nada toco
Já vejo no fundo das mãos
daquilo que fica escrito
Que escrevi coisa nenhuma do mundo
até ao esquecimento e movendo-me com as unhas
movo-me nos nomes inúmeros
para dizer que mal nasci
logo me deram por morto.
E não fui tido nem havido
na razão do episódio de um rosto
ter passado por um espelho e ter desaparecido.
Portanto não me venha ninguém falar de nada
sei bastante do que sabem todos
Vejo a água a mover-se contra si mesma
tão marítima e acho até que é bonito
cada qual morre do que alcança e não alcança
e ninguém compreende
a água que toca os dedos que escreveram até às pontas
e passa a água fácil
sem retorno
porque nada tem retorno e tudo é dificílimo
não só o máximo, mas também o mínimo.


Poesia dita

Fernando Alves diz Herberto Helder - 'Levanto à vista' in 'Servidões'

Vídeo da autoria de Cine Povero


(Filmado em São Julião e na Senhora do Monte (Lx.)).

Sem comentários:

Enviar um comentário