Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

05 janeiro, 2014

Mulher, essa espécie ainda envergonhada


Mulher. Eu sou mulher. Sinto-me muito mulher. 

Uma vez, uma amiga contou-me que um amigo dela que me tinha conhecido lhe perguntava sempre por mim e, quando ela brincou com ele, ele disse-lhe que achava que eu era a mulher mais mulher que ele tinha conhecido. Nunca nada sobre mim me agradou tanto. 

Uma mulher muito mulher. Toda mulher. Orgulhosamente mulher. Feminina, namorada, amante. E mãe. E muito mãe. Mãe desdobrada em mãe dos filhos dos filhos, cada vez mais mãe.

Ser mulher não me pesa. Ser mulher deixa-me voar.

Mulher desde que nasci, sempre. Em cada instante. Mulher. Escrevo palavras de mulher. Sou corajosa como só as mulheres sabem ser. Sou brava e sou doce como só às mulheres fica bem ser.

Mulher.


Graffiti numa parede perto da ex-Lisnave




Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
Vai carregar bandeira
- cargo muito pesado pra mulher,
essa espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.


['Com licença poética' de Adélia Prado, aqui]



Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.


[Início de 'Poema de Sete Faces' de Carlos Drummond de Andrade']


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