Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

25 novembro, 2013

E, sem razão, repito a todo o instante nos meus lábios cansados esse nome que ainda me falta em quase tudo


Foste-te com o frio e deixaste-me sem o teu calor na cama em que antes nos embalávamos. Passeio agora sozinha junto ao rio e, onde antes havia a tua mão, agora há apenas a saudade da tua companhia. O rio turva-se, o azul escurece, são nuvens, são recordações, são sombras.

Caminho e, em surdina ou nem isso, vou dizendo o teu nome, vou chorando as minhas mágoas. Aqui ninguém sabe o que se passou na minha vida. Sou orgulhosa demais para mostrar os meus sentimentos. Mas, aqui, onde ninguém me ouve, choro em silêncio a dor e as saudades, tão insuportáveis. Porque te foste? Porque me deixaste aqui sem ti? Nunca antes pensei que isto me fosse acontecer. Nos meus sonhos, eu e tu éramos um para todo o sempre.

Mas deixa.

Há mais marés que marinheiros. De onde vieste, há mais como tu. Não tenho pressa. Não nasci para caminhar sozinha nem para me deitar sozinha na cama. Nada a fazer: sou assim. E sei que não caminharei sozinha por muito tempo.

Talvez um dia, quando eu caminhar acompanhada pela sombra da tua memória e chame o teu nome, seja um outro a responder à chamada. E talvez venha rodeado de palavras voando à sua volta, talvez venha para me dizer ao ouvido poemas de amor e para me aquecer nas noites frias em que a saudade me gela. Talvez, então, eu o deixe entrar na minha vida, na minha cama, no meu corpo.

Por isso, se te foste, deixa-te estar onde estás e não voltes. Vou esquecer o teu nome.



[Abaixo de um rio azul como uns lençóis muito frios, recebo uma vez mais Maria do Rosário Pedreira que sempre será aqui muito bem vinda. Logo a seguir o violino de Benjamin Schmid faz-nos uma excelente companhia]


O Tejo este domingo avistado do Ginjal, toldado pelas nuvens que fazem sombra nas águas



                                          Sei a nuvem de cinza que turva o
                                          oceano, a sombra que desfigura a
                                          minha mão vazia. Sei as paisagens
                                          que um dia se deitaram entre nós
                                          para sempre adormecidas. Sinto

                                          a dor estendida sobre a memória
                                          do teu corpo na cama que ficou
                                          aberta como uma ferida. E, sem
                                          razão, repito a todo o instante nos
                                          meus lábios cansados esse nome
                                          que ainda me falta em quase tudo.



[Poema de Maria do Rosário Pedreira in 'Nenhum Nome Depois']


2 comentários:

  1. A presença da ausência deixa marcas.

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    1. Deixa. Mas não deveremos ficar as escavá-las ainda mais. (Digo eu que, felizmente, ainda não as senti na pele, pelo menos das do tipo de que aqui falo)

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