Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

25 abril, 2013

No 25 de Abril, a desditosa pergunta: Para quê?, testemunhando que a perda se instalara para sempre


Nós não somos a Grécia, dizem os amigos dos destruidores da Grécia. Eles são pobres mas nós não somos uns pobres iguais a eles, nós somos uns pobres mais submissos que eles, o melhor povo do mundo, um povo que empobrece pacificamente, um povo que por delicadeza se deixa morrer, dizem. 

Mas eu digo que nós somos pobres como os pobres da Grécia porque todos os pobres são iguais. E ainda mais iguais se espoliados. E ainda mais iguais se sem esperança, sem tecto, sem chão.

Para quê? Para que empobrecem os povos? Para que empobrecem os que já são pobres?

Porque abandonam à sua sorte aqueles a quem já retiraram quase tudo?

25 de Abril parece distante quando olhamos para o nosso pobre País entregue às mãos de gente cuja missão parece ser destruir a esperança e o futuro.

E, no entanto, há um povo que por vezes não se deixa pisar e se levanta cantando. Ouvi há menos de uma hora uma multidão cantando a Grândola e vi que do chão se levantavam mil clarões que iluminavam os céus, que levavam a força de mil braços que se erguiam. 25 de Abril sempre! 25 de Abril sempre!




[Abaixo do fogo de artifício, um poema de Hélia Correio relembra a tragédia grega e a nossa e, a seguir, Sérgio Godinho recorda-nos que a vida não acaba quando nos colocam uma barreira à nossa frente: hoje é o primeiro dia das nossas vidas. Sempre.]

Há poucos minutos, fogo de artifício comemorando o 25 de Abril



                                       Diz-se: a nossa indigência nada tem
                                       de semelhante é dele. E o seu grito,
                                       essa pergunta, a última a sair
                                       da garganta cortada, pouco audível
                                       entre o golfar do sangue, a desditosa
                                       pergunta: Para quê?, testemunhando
                                       que a perda se instalara para sempre,
                                       era o filho abandonado, aquele
                                       que os deuses, retirando-se, não olham
                                       nem favorecem mais.



                                       [Poema 5 de Hélia Correia in A Terceira Miséria]


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