Como um animal vencido curvo-me a teus pés e não sei se me ajoelho perante este rio liso e alinhado como um lençol ou se me ajoelho a teus pés para te pedir que te deites comigo neste leito macio e azul.
Espreito-te, rendido, aí estás muito bela, erguida como uma árvore elegante e suave.
Penso ou sonho, não sei, que um dia darás frutos e fecho os olhos porque sei que, nessa altura, os tomarei nas minhas mãos, agradecido. Depois tomá-los-ás tu, meu amor, e dar-lhes-ás todo o teu carinho e o leite morno dos teus seios.
Olhas o rio, olhas para mim, paciente, esperas que me passe esta devoção feita de amor, desejo e lágrimas.
Digo-te vamos mergulhar, vamos deitar-nos nesta cama, vamos amar-nos no fundo do mar. Ris. Paciente, esperas, sorris, levanta-te, anda.
Mas não posso. Ainda não.
Venero as águas puras deste rio tão amado, estas águas cheirosas, carregadas de doce maresia, e venero o teu corpo, as pernas talhadas com delicadeza, as ancas redondas e macias como as margens deste rio quase mar, os seios erguidos como arbustos floridos, os braços longos como asas, o rosto belo como o céu.
Mas não posso. Ainda não.
Venero as águas puras deste rio tão amado, estas águas cheirosas, carregadas de doce maresia, e venero o teu corpo, as pernas talhadas com delicadeza, as ancas redondas e macias como as margens deste rio quase mar, os seios erguidos como arbustos floridos, os braços longos como asas, o rosto belo como o céu.
Insistes, sorrindo, vá lá, levanta-te, vem. Peço-te, espera, deixa-me aqui estar, deixa-me aspirar o cheiro do rio, deixa-me escutar o silêncio das águas, a doçura desta tarde. Respondes, então, se não vens, vou eu, espero por ti lá em cima.
E eu ergo o rosto a tempo de ter ver abrir os braços, desdobrar as longas asas coloridas e voar, elevando-te, livre, bela, dançando no ar, desenhando a paisagem, soltando no horizonte luzes douradas que parecem palavras doces como o amor.
[A seguir ao belo poema de Manuel Gusmão poderá ouvir-se uma música imprevista, um intérprete imprevisto, um grande intérprete. É na rua, em Villa de Cura, Aragua, Venezuela que Victor Morales improvisa uma quirpa llanera]
Num dos cais do Ginjal, sobre o Tejo |
É a paisagem que desejo
o teu corpo assim pintado
perto do rio e das suas margens
erguido como as árvores, em tumulto
como os maciços de arbustos.
o teu corpo dá frutos que apanhas
e fazes com eles um chapéu
de abas pintadas como
nas aves as asas.
['A pintura corpo a corpo, os corpos das pinturas; pintores pintados' #3 de Manuel Gusmão in 'Pequeno tratado das figuras']
bonito. tudo.
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