O homem parte sozinho no seu pequeno barco, atravessa o Tejo. Vejo-o junto a Lisboa, vejo-o do lado de lá, vejo-o agora aqui, já perto de terra. É uma pequena figura que se levanta num pequeno barco. Lisboa a magnífica é o cenário à frente do qual o pescador solitário se recorta enquanto caminho e o olho. Fotografo-o.
Com quem é que este homem fala quando atravessa o Tejo sozinho, rente às águas belas que correm para o mar? Quando vem o peixe e ele quer festejar, fala com quem? Ri sozinho? Grita? Chora quando se sente desacompanhado?
Com quem é que este homem fala quando atravessa o Tejo sozinho, rente às águas belas que correm para o mar? Quando vem o peixe e ele quer festejar, fala com quem? Ri sozinho? Grita? Chora quando se sente desacompanhado?
Terá deixado o seu amor em terra firme, terá dado um abraço a alguém que lhe dirá em dias de carinho, tu vê lá, tem cuidado com o rio que ele pode ser traiçoeiro, tu não te deixes ir na conversa das sereias. Ou, se o dia é de fúria, talvez lhe agoure, tomara que vás e não voltes, que eu antes só que em má companhia, fica com a que metes no barco, fica com a que te puxa para ela, deixando-me aqui sozinha, tão vadio és tu como é ela.
E ele vai, sentindo as palavras no seu peito, guardando no coração o olhar de quem ficou em casa, esperando.
Ao cair do dia, o pescador regressa. Mas hesita, por aqui fica. É aqui que agora o vejo, de pé ainda. Erguido, solitário.
No entanto, reparo que, afinal não está só. À sua volta uma gaivota voa, não se afasta dele, acompanha-o. E ouço as suas palavras: o pescador conversa. É com ela que o pescador conversa, é a ela que o pescador confessa as suas mágoas, as suas alegrias. Ela é a grande rival do amor que fica em terra. Ela é a que dança, a que não abandona, a que é livre e não quer prendê-lo.
Ela é a que escuta os seus segredos na luz e na escuridão, ela é a que o leva nos braços até à noite, ela o levará um dia para longe. São os seus gritos que o salvam do silêncio.
[Abaixo do pescador com gaivota, um excerto de O poema contínuo e ia dizer belíssimo mas inibo-me, as palavras parecem menores quando por perto de Herberto Helder. A seguir, mais um momento feliz, agora é Jorge Palma e Cristina Branco com um arranjo de Rui Massena e hoje o tema tem que ver, é a Estrela do Mar]
No Tejo, junto a Cacilhas, pescador com gaivota |
Uma canção de agora dirá que as noites
esmagam
o coração. Dirá que o amor aproxima
a eternidade, ou que o gosto
revela os ritmos diuturnos, os segredos
da escuridão.
Porque é com nomes que alguém sabe
onde estar um corpo
por uma ideia, onde um pensamento
faz a vez da língua.
- É com as vozes que o silêncio ganha.
[Excerto de 'Ou o poema contínuo' de Herberto Hélder]
Olá, parabéns pelo blog!
ResponderEliminarSe você puder visite este blog:
http://morgannascimento.blogspot.com.br/
Obrigado pela atenção
Olá Morgan,
EliminarMuito obrigada pela visita e pelas palavras. Boa sorte para o seu blog.
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