Vem e vem e vem, todas e tantas vezes que o queiras, vem, vem, vem. Debruça-te sobre mim, cinge-me, cinge-me bem; que interessam os segredos que amordaçam o desejo?
Vem, debruça-te sobre mim, banha-me com o teu olhar, com a tua saliva e, depois, seca-me, assim, com cuidado e macieza, com o perfume do teu cabelo. Arrepia-me com o deslizar lento do teu cabelo na minha pele, roça-me a pele devagar, devagar, devagar.
Vem sempre que te apeteça, vem e cinge-te a mim, cinge-te ao teu calor, cinge-te à tua vontade, cinge-me assim, abraça-me, cobre-me, cinge-me com força, com esperança, beija-me com toda a tua infantil liberdade. Vem, anda descobrir o meu corpo.
Vem antes que seja tarde. E mesmo que seja tarde, vem na mesma. Vem agora que o tempo ainda é breve, mas vem também quando muito tempo tiver passado e o cansaço nos cobrir o corpo - vem sempre.
O sol está quente, o rio brilha, a relva é macia e a terra está húmida, macia. Não esperes pela noite, que a noite vem rodeada de sigilos e sombras. Vem já. O teu corpo é ágil, flexível, quente, aromático, saboroso, debruça-te assim sobre mim, cinge-te a mim, afoga-me na tua carne e deixa-me morder-te, vem, deixa-me viver contigo uma grande aventura.
[Bem, ficamos por aqui. Logo abaixo do casal que se cinge ao essencial à beira do rio, encontraremos um belo poema de Gastão Cruz. Logo abaixo a grande voz de Placido Domingo adoça a grande música de Richard Wagner.]
'Esplendor na relva' - no idílico e pequeno Jardim do Ginjal, rente, rente a um Tejo brilhante |
Quando o tempo cingindo esse
sigilo cingir-te te cingir a carne
toda se eu te cingir com ele
é porque a esperança
alterou o segredo
do mundo
Das noites quem esse abismo
todo já conhece quem de todo o espera
quando o tempo vier cingir-te o corpo
quero que me conheças
alteres e libertes
sobre o mundo
Quando o tempo cingindo-te
cingir esse cansaço esse rumor
da carne do amor da liberdade
é porque sobre o medo
a esperança altera
a aventura
['Alteração - Quando o tempo cingindo esse' de Gastão Cruz in 'A doença']
Olá cara UJM:
ResponderEliminarHoje sensual, com as palavras de Gastão Cruz, poeta hermético, como o chamaram, e um afectuoso instante na relva.
Num tempo de cansaço e de tecnologias, num tempo em que todos sabem tudo de todos, mas num tempo em que as pessoas mal se veem, mal se tocam, vital a linguagem do corpo, a linguagem da sensualidade que brota dos corpos cingidos na relva, à luz e ao calor do sol: transfiguração do medo, na esperança deste tempo.
E tenha uma bela e divertida noite de Sto. António.
Abraço amigo da
Luísa sobe a calçada
Olá Luísa subindo a calçada para chegar até a este jardim de relva,
ResponderEliminarPois é, tal como acabei de escrever no texto que acabei de publicar, isto já deve ser mesmo do Sto. António. O espírito do santo casamenteiro parece que 'desceu' em mim e está a dar-me para escrever coisas assim. Hoje foi o mesmo - e tenho que pôr o travão às quatro rodas para a coisa sair com um mínimo de decoro.
Acho que são os poetas que me inspiram.
Mas gostei imenso de ler o que escreveu. Que belas palavras as suas. Se pegar nelas e as transpuser para o UJM não leva a mal, não?
Ainda não sei bem o que vai ser mas estou aqui com umas ideias. Já vejo.
Divirta-se Luísa, calçada acima ou calçada abaixo, mas tenha uma bela noite e um belo dia!
Olá cara UJM:
ResponderEliminarPode usar e abusar, o privilégio será meu!
Abraço amigo da
Luísa sobe a calçada
Ontem ia lançada para arranjar maneira de usar este belo texto quando dou de caras com o comentário do Leitror DBO que usou uma palavra que eu não conhecia e que achei linda (cendal).
EliminarTão impressionada fiquei com essa descoberta que, se formou, de súbito e vá lá perceber-se porquê, a história da Leda.
Por isso o seu texto ficou em stand by para ser usado sem rivais por perto...
Obrigada pela autorização, Luísa.