Tantas vezes aqui clamo o meu amor, grito-o ao vento, voo sobre o Tejo e grito-o aos barcos, às gaivotas, enrolo-me nas velas dos veleiros brancos e grito que te amo, deslizo e mergulho, e digo que te amo. Ou torno-me aragem, vento, pluma, pena e acaricio a tua face e beijo-te e abraço-te, ou corro pelos ares e sou como as folhas douradas e ando junto aos teus pés, enrolo-me nas tuas pernas, folha, flor, vento, pássaro, aragem, e sou eu sempre junto a ti.
Outras vezes sou transparente, silencioso, e encosto-me a ti enquanto vais sozinha, e falo contigo, sussurro ao teu ouvido e tu ris, e brinco com o teu corpo, mexo-te, puxo-te, enrosco-me e tu contas-me os teus segredos, contas-me os teus sonhos e eu ouço-te, minha amiga, meu amor, conta-me tudo, que eu estarei sempre a teu lado ou, então, dentro de ti.
E quando estás tensa, triste e cansada ou quando estás animada e feliz, estou eu sempre junto a ti, a minha mão a conchegar o teu coração, o teu sorriso na concha das minhas mãos, sempre a teu lado, sempre a sentir a tua respiração rente à minha.
Mas tu sabes isto, não sabes?
[Palavras em festa pedem uma música em forma de primavera - é já aí em baixo, depois do belo poema do Assis Pacheco]
Rente ao Tejo de frente para Lisboa, a Bela e Luminosa |
Falei de ti com as palavras mais limpas,
viajei, sem que soubesses, no teu interior.
Fiz-me degrau para pisares, mesa para comeres,
tropeçavas em mim e eu era uma sombra
ali posta para não reparares em mim.
Andei pelas praças anunciando o teu nome,
chamei-te barco, flor, incêndio, madrugada.
Em tudo o mais usei da parcimónia
a que me forçava aquele ardor exclusivo.
Hoje os versos são para entenderes.
Reparto contigo um óleo inesgotável
que trouxe escondido aceso na minha lâmpada
brilhando, sem que soubesses, por tudo o que fazias.
['Sem que soubesses' de Fernando Assis Pacheco in 'A Musa Irregular']
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