Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

16 novembro, 2011

Às vezes nem sequer podemos garantir que houve um sinal

 
Quando foi? Quando foi que resolvemos que nem a memória merecia já qualquer alimento? Houve uma palavra que marcou o momento em que nos dissemos adeus? Houve um pestanejar, um trejeito, uma desatenção? Nem sei se isso interessa. Afastámo-nos, fomo-nos afastando, afastámos o olhar, afastámos as vozes, apagámos todos os vestígios - e isso é a verdade que importa.

Ainda te lembras de mim ou até o pensamento se afastou já também? Quando caminhas, quando percorres as estradas ou os campos, ainda me vês, ainda me ouves? Às vezes ainda te sorris ao lembrares-te de mim? Diz que eu consigo suportar. Sei o que isso é. Não és só tu. Perdemos os sonhos e era tão bom sonhar, não era? Fechavas os olhos e pensavas em mim, não era? Nunca dançámos, nunca vamos dançar, mr and mrs jones ou outra qualquer, nunca nos vamos enlear ao som da música, a música abandonou-nos também.

Por onde andas, amor que um dia amei?


Junto ao Farol de Cacilhas, rente ao Tejo, Lisboa já ali


                                 Às vezes nem sequer podemos garantir
                                 que houve um sinal

                                 e por isso é difícil saber se     efectivamente
                                 chegou a hora destinada a afastar os olhos
                                 dos vestígios de ti

                                 às vezes há apenas um leve fio de espuma a
                                 contornar     eficazmente     os sonhos que
                                 perdermos por nossa culpa     dando
                                 estranhos nomes ao que sempre soubemos
                                 ser inominável


                                 e os nossos dedos deixam marcas no copo    enquanto
                                 a música desiste de nós
                                 ao primeiro acorde dissonante


(Poema '8' de Alice Vieira in 'O que dói às aves')

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