Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

19 julho, 2011

Quero-te, como se fosses a presa indiferente, a mais obscura das amantes

Gosto que me queiras assim, amante indiferente, presa obscura, falsa presa, incansável caçadora.

Gosto que recordes as minhas palavras - também o meu rosto, também o calor do meu corpo, também o meu perfume, também o meu olhar, também o meu sorriso, também o vento que às vezes dá na minha saia rodada, também as minhas mãos num terno afago - mas sobretudo as minhas palavras.

Gosto de pensar que, às vezes, fechas os olhos e, decidido a esquecer-me, recordas, uma por uma, todas as minhas palavras, palavras às vezes decididas, outras vezes incertas como a rosa soprada pela aragem que vem do rio, palavras que te despem, palavras que me despem, palavras que me expõem, nua perante ti.

Palavras de amor para usares sobre a tua pele. Ou sob a tua pele, como queiras.

Dias felizes: casal namora junto ao Tejo, no Farol de Cacilhas, o Terreiro do Paço logo ali, o Castelo de S. Jorge no alto da colina

Quero-te, como se fosses
a presa indiferente, a mais obscura
das amantes. Quero o teu rosto
de brancos cansaços, as tuas mãos
que hesitam, cada uma das palavras
que sem querer me deste. Quero
que me lembres e esqueças como eu
te lembro e esqueço: num fundo
a preto e branco, despida como
a neve matinal se despe da noite,
fria, luminosa,
voz incerta de rosa.

('Poema de amor para uso tópico' de Nuno Júdice in Poesia Reunida)

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