Estás aqui e és tu e mais ninguém.
Olhas a tua mão e pensas que não estou aí para a afagar; então, com a tua outra mão, substituis a minha, para que elas não ardam de silêncio.
Quase não falas mas, quando ouves a tua voz, pensas que eu estou longe, não a poderei ouvir, e lamentas que eu não esteja aí para te dizer como gosto dela.
Olhas as pequenas coisas à tua volta, tentas entreter-te com esses pequenos afazeres.
Mas sobrevives.
Sabes que eu, mesmo estando longe, estou contigo.
Por isso, alegra-te, deixa que o destino guarde para ti, para um dia,uma alegria verdadeira.
No Ginjal, sobre o Tejo, a Ponte por trás, pescador solitário num dia de chuva
Não tem amor senão do amor.
É um homem devastado pelo pensamento da alegria.
Deus vive nele um tempo obscuro
de esquecimento. Este homem mora
nas coisas miúdas transportas,
comparadas, alvitradas, justapostas.
Vive em/arco.
Pensa em/espírito de fogueira.
Tem toda a mão queimada até ao silêncio
atroz. Rodearam-lhe a voz.
Contudo, seu ser é destinado à alegria verdadeira.
(Excerto de 'Ou o poema contínuo' de Herberto Helder, obra maior da poesia)
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