Ginjal e Lisboa

Ginjal e Lisboa

15 março, 2011

Não tem amor senão do amor; contudo, o teu ser é destinado à alegria verdadeira

Estás aqui e és tu e mais ninguém. 

Olhas a tua mão e pensas que não estou aí para a afagar; então, com a tua outra mão, substituis a minha, para que elas não ardam de silêncio.

Quase não falas mas, quando ouves a tua voz, pensas que eu estou longe, não a poderei ouvir, e lamentas que eu não esteja aí para te dizer como gosto dela.

Olhas as pequenas coisas à tua volta, tentas entreter-te com esses pequenos afazeres.

Mas sobrevives.

Sabes que eu, mesmo estando longe, estou contigo.

Por isso, alegra-te, deixa que o destino guarde para ti, para um dia,uma alegria verdadeira.

No Ginjal, sobre o Tejo, a Ponte por trás, pescador solitário num dia de chuva

Não tem amor senão do amor.
É um homem devastado pelo pensamento da alegria.
Deus vive nele um tempo obscuro
de esquecimento. Este homem mora
nas coisas miúdas transportas,
comparadas, alvitradas, justapostas.
Vive em/arco.
Pensa em/espírito de fogueira.
Tem toda a mão queimada até ao silêncio
atroz. Rodearam-lhe a voz.
Contudo, seu ser é destinado à alegria verdadeira.


(Excerto de 'Ou o poema contínuo' de Herberto Helder, obra maior da poesia)

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